Aviso: CONTÉM SPOILERS!
LOS ANGELES – Não só Hollywood, mas toda a indústria do Entretenimento, vive um momento definitivo e, nas proporções corretas, desesperador: ninguém sabe para onde o cinema, a TV e a literatura vão. Índices de atenção cada vez menores, oferta gigantesca de conteúdo, a necessidade absurda por produtos gratuitos e, claro, a pirataria contra os gigantes do mercado. São muitas variáveis e a instabilidade torna-se inevitável.
Os produtores entenderam a sociedade moderna: divertir, homenagear o passado, e permitir o sonho por um futuro interessante.
Logo, todo mundo está testando soluções – algumas às claras, outras só nos nichos ou mesmo a portas fechadas. Já existe um projetor de 8k de resolução, projetores 3D sem óculos tão poderosos que não se sabe onde acaba o filme e começa o ambiente real e até mesmo hologramas com sensor de movimento, transmissão ao vivo e reconhecimento de voz.
Parte dos testes, porém, envolve descobrir os gostos do público para sustentar a indústria durante essa transição traumática – que deve ocorrer nos próximos cinco anos – e é aí que “Os Vingadores” se encaixa nisso tudo. Quadrinhos e filmes de nicho tem o maior potencial para unir gerações, garantir resultados e, de certa forma, ser um porto seguro durante a tempestade. E é exatamente isso que a Marvel fez sob o comando de Kevin Feige.
Porém, “Os Vingadores” não é um teste, mas sim a conclusão óbvia da estratégia por trás dos bons filmes do “Homem de Ferro” (com vantagem para o primeiro), os dois “Hulk” (com desvantagens espalhadas entre o criativo Ang Lee e pau-mandado Louis Leterrier), o neutro “Thor” e o fantástico “Capitão América”! Gostem os fãs de quadrinhos, ou não, a verdadeira estratégia por trás disso tudo é a construção de um novo público.
A lição tirada de “Os Vingadores” é justamente a da consolidação de um plano efetivo e lucrativo.
Os nerds foram a base inicial e já cumpriram sua função como o primeiro estágio de um foguete. Deram a propulsão, agora está na hora de expandir e solidificar. Basta olhar as análises de público antes mesmo da estréia nos Estados Unidos: o filme lidera as bilheterias em TODOS os quesitos.
Remanescentes da Golden Age, jovens dos anos 80, mulheres, crianças, espectadores casuais… todos optaram pela aventura de Joss Whedon. E como poderiam resistir? Mesmo quem nunca encostou num quadrinho na vida, mas vai ao cinema ou vê TV, já ouviu falar no Homem de Ferro, no Hulk, em Thor e, claro, no Capitão América – especialmente aqui no Tio Sam.
De maneira alguma essa foi uma invenção de Feige e da Marvel, mas eles encontraram a medida certa para construir seu sucesso e, para isso, precisaram revisitar o passado ao usar os pesos pesados da companhia e fazer isso de caso pensado. Os produtores parecem ter entendido a necessidade da sociedade moderna: divertir, homenagear o passado, e permitir o sonho por um futuro interessante.
Essa frase não é nem um pouco idealista, basta ver o mito construído por Stallone com a franquia “Mercenários”. É exatamente a mesma táctica utilizada pela Marvel. E Avi Arad também sabe disso com seu “Espetacular Homem-Aranha”, o grande inimigo intelectual e dramático de Christopher Nolan, pelo menos nesse ano.
Comédias entregam gratificação instantânea e isso está incutido no cerne de “Os Vingadores”.
Essa estratégia é para poucos pela gigantesca proporção de investimento necessário para atrair a atenção do público antes mesmo da estreia. Já se fala em maior bilheteria da história, alias. Tudo isso passa pela arriscada opção de super-expor a marca, com infindáveis trailers, pôsteres, prévias, campanha de imprensa com marcação homem a homem em todos os grandes mercados e, mais recentemente, o convencimento à esfera blogueira, que não precisa de mais que uns trocados para vestir qualquer camisa, infelizmente.
Entretanto, a lição tirada de “Os Vingadores” é justamente a da consolidação de um plano efetivo e lucrativo. Como tudo que fica popular, a “posse” dos heróis dos quadrinhos passa das mãos dos leitores intelectuais dedicados a cada detalhe aos volúveis espectadores satisfeitos apenas com as duas horas de projeção.
Joss Whedon trabalhou três elementos fundamentais para o sucesso de “Os Vingadores” no aspecto cinematográfico: comédia, distribuição de tempo de tela e o Hulk!
Comecemos pelo gigante esmeralda: Depois de duas tentativas frustradas do ponto de vista qualitativo (embora eu tenha gostado de Edward Norton como Bruce Banner), eis que o Hulk surge com personalidade, utilidade e apareceu apenas nas horas certas. Mark Ruffalo atrapalhou menos do que aparentava e criou curiosidade ao “outro cara”. Esse personagem foi tanto a arma tática dos Vingadores em combate, como do filme, construído em torno de sua revelação, sem se preocupar muito com os dilemas de Banner e seu passado. Hulk apareceu, esmagou e conquistou!
Tudo foi bem distribuído, evitando assim, o “filme do Homem de Ferro e seus amigos”.
Se ele apareceu nas horas certas, o humor esteve presente ao longo de todo filme. Essa parece ser a grande chave dos vídeos virais mais atuais e, sem dúvida, o gênero favorito dos espectadores online. Comédias entregam gratificação instantânea e isso está incutido no cerne de “Os Vingadores . O roteiro arma sua estrutura e fecha todos os pontos, cômicos ou dramáticos, ao longo da exibição e isso é muito importante, pois entrega um produto fechado. É mentalidade de linha de produção e decisão de executivos, como disse o Merigo? Com certeza. Mas a execução foi fantástica.
Outro dia ouvi o Spielberg dizendo que sempre assistia filmes tentando ver os movimentos de camera, onde usaram grua ou dolly, onde entraram os efeitos ou a edição mais fresta, até que ele desistiu e agora só quer ver se puderam contar uma história. Bem, “Os Vingadores” conta uma história. Simples, pelo olhar de quem nunca ouviu falar nos quadrinhos, mas conta.
Um cara mal quer mandar na gente (e resolve aparecer justamente na Alemanha, onde se depara com um velhinho casca-grossa que não quer ver a história se repetir), então vamos chamar uns sujeitos meio problemáticos, mas superpoderosos, para segurar a onda e lutar pela gente. Tudo bem que ela começou vários filmes atrás, mas está lá. Começo, meio e fim. Infelizmente, hoje em dia isso é celebrado perante tantos roteiros confusos, temas pretensiosos e tentativas frustradas de se atingir alta intelectualidade.
Se os produtores se meteram no processo, e, com certeza, Kevin Feige virou o Kuato do Joss Whedon, os medos financeiros garantiram foco nas fórmulas que dão certo. Se a comédia – com suas piadas quase sempre certeiras – e o Hulk – com sua magnanimidade – funcionaram, o outro elemento da base foi o tempo de tela. Tudo foi bem distribuído, evitando assim, o “filme do Homem de Ferro e seus amigos”.
“Os Vingadores” escorrega pesado nos dois personagens secundários que são, estruturalmente, o freio de mão do filme: Gavião Arqueiro e Viúva Negra.
Formaram-se vários núcleos renovados constantemente, primeiro reforçando a desorganização dos heróis, depois explorando as forças. Uma das melhores decisões foi inserir o Thor tarde e deixa-lo meio escondido, afinal, seu filme solo foi o mais insosso e o Deus do Trovão não aguentaria levar a ação toda nas costas. E nem seria o caso, afinal, se o filme é d’Os Vingadores, eles devem lutar juntos. E como lutaram! As cenas de combate foram fantásticas e, enquanto aquele mundo caia, o espectador empolgado queria mais.
Como ação, “Os Vingadores” é empolgante. Loki deixa claro desde o princípio: vou enganar todo mundo e quem dita as regras sou eu. Tanto Nick Fury quanto os heróis caem na arapuca e pagam caro por isso, até por uma certa ingenuidade, algo que todo ser humano tem ao imaginar que as coisas vão funcionar da maneira ideal logo de cara. Bem, não é por aí e Whedon transferiu um grande conceito norte-americano para seus heróis: a América só funciona com motivação e um objetivo único. Desde a Segunda Guerra Mundial, esse pais não faz nada de forma unilateral. Nem mesmo a Guerra ao Terror foi aceita por todo mundo, logo, olha a referência ao nazismo novamente.
Acima de tudo, os realizadores buscaram elementos de fácil acesso à memória de seu público e isso deve ser encarado de forma positiva, uma vez de que fácil e efetivo não são sinônimos. Nolan quer ser cerebral, deixar o espectador tenso o tempo todo e extrapolar os limites do drama? Ótimo. Whedon fez isso na alucinação do último combate (que deve estar dando calafrios até agora no Michael Bay) e no envolvimento prático e simples gerado pelo bom-humor. Entretanto, isso não significa que “Os Vingadores” seja isento de falhas.
A Marvel lembrou que filmes de heróis podem ser divertidos e, acima de tudo, que o ciclo está completo.
No geral, agrada. E muito. É bem feito. E muito. Merece os louros da fama e do sucesso. Totalmente. Mesmo assim, escorrega pesado nos dois personagens secundários e, estruturalmente, o freio de mão do filme: Gavião Arqueiro e Viúva Negra. Se toda a preparação dos heróis principais foi feita ao longo de seus filmes solo, esses dois eram apenas rostos pouco familiares, com histórias de fundo praticamente nulas. Mesmo sabendo do extremo respeito e devoção entre eles, foi difícil engolir uma dinâmica aparentemente forçada na tela. Como arqueiro, adoraria ter o arco high-tech do Gavião, mas esse foi o máximo de atenção gerado pelo sujeito, mas tenho noção de que esse sentimento é bastante pessoal.
Mas isso se encaixa perfeitamente no contexto que estou trabalhando: esse filme é sobre gente especial que salva a “gente comum” na hora do aperto. Sendo frio e calculista, o personagem de Jeremy Renner é um baita arqueiro. E ponto. Foi escravizado pelo vilão, matou meio mundo e não teve tempo, nem roteiro, nem dramaticidade para se redimir de forma a justificar sua presença.
O outro grande problema foi a morte do agente Colson. Assim como Boba Fett, em “O Retorno de Jedi”, morreu para render uma piada. Falo da cena em si, não dos efeitos provocados por seu ato heróico (e a artimanha do Fury). Faltou algo, uma justificativa melhor naquele momento, mas diria que foi mesmo falta de respeito por um personagem tão querido, pois ele era uma espécie de C-3PO dos Vingadores poderia muito bem ter permanecido como constante no universo Marvel nas telonas.
Saí da seção de “Os Vingadores” absolutamente apaixonado pelo trabalho em equipe, pelo Hulk todo espirituoso, pela grandiosidade do quebra-pau, e louco de vontade de encher o Loki de safanões a lá Marshall, do “How I Met Your Mother”. Saí feliz, doido para ver outra vez e, devo dizer, arrependido por ter vaiado o Kevin Feige na Comic-Con quando ele anunciou o Rufallo como Bruce Banner. A Marvel fez um ótimo trabalho, demonstrou a força da grande marca frente ao público disperso, lembrou que filmes de heróis podem ser divertidos e igualmente agradáveis, e, acima de tudo, que o ciclo está completo.
Nerds, vencemos a batalha. O mundo é nosso.
Post originalmente publicado no Brainstorm #9
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